1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 354

Nesse caso, para uma grande parcela da população brasileira, a sensação de que se vive no Brasil sob um Estado de Direito Democrático, com direitos civis respeitados, só se dá no campo jurídico-formal ainda hoje. Nesse sentido, Mondaini enuncia que há um “descompasso” entre aquilo que se encontra inscrito na ordem normativa e o que se apresenta no plano da realidade social. Para finalizarmos, devemos ressaltar que o padrão sociocultural de que o país estava em combate contra condutas e comportamentos considerados ameaçadores e perigosos afetou significativamente a condição jurídica dos grupos de esquerda que se opuseram ao regime militar, mas também dos segmentos populares. Pessoas que moravam em bairros periféricos e favelas também foram vítimas das arbitrariedades do aparato repressivo judicial. No entanto, esse padrão sociocultural institucionalizado durante o regime militar produziu efeitos contraditórios no período de transição para a democracia. Se o movimento dos direitos humanos encontrou forte aceitação pela sociedade no que diz respeito às violências sofridas pelos grupos de esquerda opositores ao regime militar, não teve a mesma concordância quando se tratou de denunciar as ilegalidades cometidas pelo aparato repressivo policial em suas incursões nos bairros periféricos e favelas. Inclusive, os mesmos segmentos que participaram da luta em prol dos direitos humanos começaram a dizer que direitos humanos são somente para humanos direitos (CALDEIRA, 1991). Como resultado, nesse processo de transição para um Estado democrático de Direito, a teoria do combate continuou norteando as ações repressivas nos bairros periféricos e favelas. Com isso, até à atualidade temos inúmeras dificuldades de que as instituições policiais atuem dentro dos padrões da legalidade, afetando, desta forma, o exercício pleno da cidadania no país. Gostaríamos, ao concluir este trabalho, de deixar uma pergunta no ar: Será que as pessoas pertencentes às classes populares que foram torturadas ou assassinadas ilegalmente pelo 352 1964 – As armas da política e a ilusão armada