1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 302
entre Rio e São Paulo, de modo a se evitar os postos de controle da
via Dutra. Só que era preciso dar uma volta imensa, passando por
estradas secundárias. Mas o pessoal não queria fazer isso não.
Pegava mesmo a via Dutra, pois era mais cômodo e mais rápido.
Mas, é claro, que o risco da segurança aumentava.
Criamos, por exemplo, um “aparelho” para trazer as pessoas
que se encontravam fora do Brasil e para levá-las para o exterior,
atravessando as fronteiras do país. Isso incluía viagens dentro do
Brasil, a forma como eram feitas, os trajetos etc. Mas, às vezes,
alguns se rebelavam, achavam que aquilo era um absurdo e um
exagero, que uma viagem que podia se fazer só num dia demandaria vários dias. Certos companheiros inclusive tomavam iniciativas
próprias, resolviam inventar seus próprios esquemas. Isso nos
atrapalhou muito... Mas, ainda assim conseguimos montar o trabalho. Por diversas vezes, vários foram para o exterior e de lá voltaram. O próprio Prestes fez duas ou três dessas viagens, o que
demandava cuidados especiais e a mobilização de inúmeros
companheiros, pois seria um grande desastre para a direção que o
secretário-geral do PCB fosse preso pela ditadura.
Tudo isso implicava a existência de uma atividade específica
nas fronteiras. Era uma coisa delicada porque nelas há um controle
rigoroso. Enfrentamos esse problema utilizando as características
das cidades fronteiriças e alguns militantes. Nelas os instalamos
com suas famílias. Eles passaram ali a viver normalmente, sem
causar suspeitas. E montando alguns negócios, naturalmente
transitavam pela região sem chamar a atenção da polícia. Eles
conheciam as horas de maior controle, por onde era mais fácil
atravessar as barreiras etc. Chegamos a ter companheiros que
possuíam táxis nessas cidades. Esses, normalmente, faziam a
travessia de um lado para o outro da fronteira. Assim, ninguém
podia saber que exatamente num dia tal, um deles estaria
transportando alguém que não era um passageiro comum, mas
uma pessoa que estava viajando para o exterior numa missão
partidária. Vários companheiros utilizaram esses “aparelhos” e
nunca foram descobertos.
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1964 – As armas da política e a ilusão armada