1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 209

endia a sociedade como um organismo moral em que as partes deveriam ficar subordinadas à “cabeça” (= Estado), o neoliberalismo radicalizava o individualismo possessivo – a visão da sociedade como se fosse composta por uma multidão de indivíduos desenraizados socialmente e egoístas que almejam apenas maximizar suas vantagens no mercado. Nessa concepção empirista, o homem perde o caráter de ser social e passa a ser visto, na vida pública, como um comerciante que se relaciona diretamente com outros comerciantes e, na vida privada, como mero consumidor “reivindicante”. No Brasil, os estertores da ditadura militar e o início da Nova República retardaram o processo de “desestatização da sociedade” e “dessocialização do Estado” – outra peculiaridade de um país que conheceu, com Vargas, a ação pioneira do Estado interventor. Os ventos do neoliberalismo fizeram-se sentir, tardiamente, somente no governo Collor e, em seguida, durante os oito anos de Fernando Henrique Cardoso.9 Este último, em seu discurso de despedida do Senado, afirmou taxativamente que o seu governo iria marcar “o fim da era Vargas” (por uma ironia, a antiga reivindicação do “novo sindicalismo” encontrou um inesperado aliado...), justamente no momento em que a reestruturação produtiva, a precarização do trabalho, o desemprego crescente e a crise de representação dos partidos e associações classistas, finalmente, faziam seu ingresso no Brasil. A privatização das empresas estatais e a reforma da previdência anunciaram o novo período histórico. Nas condições específicas de país subdesenvolvido, o Estado não se retirou da economia. Ao contrário, passou a submeter toda a vida econômica