1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 186

da ideia de singularidade nacional com a finalidade de bloquear os processos de expansão urbano-industrial e de conformação de uma identidade operária autônoma. Nesse sentido, pode-se dizer que em boa parte da América Latina, àquela época, vigoraram duas matrizes antimodernas: a da esquerda e a dos intelectuais tradicionais, ambas refratárias ao Ocidente liberal, ao seu legado de lutas e conquistas. No Brasil, diversamente, a reivindicação intelectual da nossa singularidade por volta dos anos de 1920 não se revestiu de traços caracteristicamente recessivos. Enunciava-se, antes, como atualização da experiência de modernização levada a cabo pelo imperador, mediante a centralização do poder e a coordenação política dos interesses senhoriais. Tinha-se, pois, a modernização como algo inelutável. E, uma vez desenvolto o processo de industrialização, com a conversão de parcela das elites agrárias em “capitães de indústria”, o Brasil, definitivamente, não se identificaria com concepções antiocidentalistas. O PCB, em 1922, se inscreverá na vida republicana como força democratizadora da ordem institucional de 1891. A sociologia política ajuda a explicar tamanha originalidade. Originário do bem-sucedido ciclo de greves dos anos de 1917 a 1919,5 vivendo em situação de gueto político e sem contar em seus quadros com uma intelligentsia que se concebesse como aguilhão revolucionário nos moldes da experiência bolchevique, o PCB pôde se aproximar do descontentamento dos novos personagens do mundo urbano industrial e com eles caminhar em direção à superação do domínio oligárquico. São aspectos dessa aproximação a ida de Astrojildo Pereira ao encontro do então líder tenentista Luiz Carlos Prestes, e o destaque que conferiu ao Estado de São Paulo, tido como polo moderno e necessário ao avanço de uma política operário-marxista. A perspectiva era, pois, a do Ocidente político, valorizando-se o tema da democratização do país sob a liderança do moderno proletariado – o que lançava o PCB em um caminho de alianças com os personagens do mundo urbano brasileiro e acabou suscitando duras críticas da Internacional Comunista, sobretudo após o seu VI 5 ZAIDAN, Michel, 1985; RODRIGUES, Leôncio, M., 1986. 184 1964 – As armas da política e a ilusão armada