1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 185

dos também contribuiu para distanciar o partido da ortodoxia terceiro-internacionalista e produzir inovações na sua prática. Assim, na chegada dos anos de 1980, quando o PCB aprofundou sua orientação democrática em meio a um intenso movimento de massa contra o regime militar, era razoável supor que o acerto de sua política favorecesse a elaboração de uma nova práxis. Mas, como escreveu Werneck Vianna,4 o PCB não soube ganhar. E a experiência que o partido acumulou na luta por uma sociedade progressivamente mais justa e livre, se não se perdeu de todo, pois acabou incorporada à reflexão brasileira sobre o Brasil, não lhe serviu como plataforma para sua refundação. Este artigo narra, pois, uma determinada orientação comunista que tornou o PCB um dos atores das lutas sociais modernas. A derrota dessa perspectiva no interior do partido, com o subsequente afastamento da geração de comunistas que organizou a resistência ao regime militar e concebeu a política de transição à democracia, encerrou um ciclo da cultura de esquerda no Brasil, com profundo impacto no processo de consolidação das instituições e práticas democráticas no país. Origens remotas A revolução russa de 1917 afastou os movimentos revolucionários do paradigma marxista de O Capital, fazendo emergir o tema do atraso como vantagem comparativa para ultrapassagem da modernização burguesa em contextos de capitalismo imaturo. Tal “russificação” do marxismo implicava uma dramatização da intervenção política, que a esquerda latino-americana da década de 1920 traduziu na proposta de um levante político do campesinato, que o libertasse do feudalismo e da servidão. É certo que essa feição orientalista da esquerda latino-americana foi favorecida pelo travo anti-moderno das elites agrárias do subcontinente, que, como apontou José Carlos Mariategui, se valiam 4 WERNECK VIANNA, Luiz, 1989. Breve história do ‘comunismo democrático’ no Brasil 183