100 anos da Revolução Russa PD_ESPECIAL | Page 74

Erick Hobsbawm (1992, p. 96), logo após o desmoronamento dos regimes do “socialismo real” no Leste Europeu e da iminente ruína da URSS, constatou de forma lúcida: “Estamos testemu- nhando não uma crise de um tipo de movimento, regime ou economia, mas seu fim. Aqueles que nós pensávamos que a Revolução de Outubro era a porta para o futuro mundial prova- ram estar equivocados”. O fim trágico do socialismo real revelou para a esquerda em geral (comunistas, socialistas ou socialdemocratas, trabalhistas, cristãos etc.) uma situação dramática e trouxe em seu bojo proble- mas e elementos capazes de abalar não só a práxis do movimento, mas os próprios ideais do socialismo, além de legitimar, por tempo imprevisto, o capitalismo. Gramsci, se vivo estivesse – no ensejo do sesquicentenário da obra capital de Marx – provavelmente, advertiria que estaríamos carecendo de uma revolução não contra, mas a favor de O capital. Dessa forma, o processo histórico que desembocou nos fatos e acontecimentos que redundaram no colapso do “socialismo real”, criou uma situação dramática e sem precedentes, e com desdobra- mentos ainda difíceis de se visualizar, devendo ter longa duração. O que teria levado uma utopia/projeto tão generoso como o socialista – que chegou a tornar-se alternativa concreta à opres- são, alienação e exploração capitalista – à situação de infortúnio, que se encontra já há quase três décadas. Significaria isso a vitó- ria da superioridade do capitalismo sobre o socialismo? Ou como proclamou Francis Fukuyama, teríamos enfim chegado ao “fim da história” com o triunfo definitivo do liberalismo e do livre mercado? Teria sido obra da traição, capitulação e do oportu- nismo de determinados lideres, grupos ou partidos? Deve-se à degenerescência burocrática operada pelo stalinismo? Ou que, na verdade, aqueles países onde se proclamava viver sob o “socia- lismo real” não passavam de formações econômico-sociais de capitalismo de Estado? Evidentemente existem outras explicações tão ou mais simplis- tas ou outras mais complexas e sofisticadas para tal situação. Pensamos, no entanto, que para compreender a extensão e a profundidade do problema, é necessária uma análise da gênese e trajetória histórica das experiências socialistas, inclusive suas elaborações teóricas e seus elementos de previsão, sua metamor- fose e sua conformação real e concreta. É claro que isso exige um 72 José Antonio Segatto