100 anos da Revolução Russa PD_ESPECIAL | Page 71

beu que não controlava mais nada, que sua legitimidade minguava a cada dia e que perdia seu espaço de manobras” (Lewin, 2007, p. 345). Estavam criadas as condições – vazio de poder, revolta e fúria popular, ordem anômica, desorganização econômica, desmantelamento e/ou aniquilamento do exército etc. – para que um pequeno partido de vanguarda, resoluto e com propostas que atendiam os anseios imediatos das classes subalternas (pão, paz e terra), se apoderasse dos aparatos do Estado sem resistência, em nome dos sovietes (conselhos). Conquistado o Estado – onde ele era tudo e a sociedade civil rarefeita – os bolcheviques logo trataram de recompor o poder, em meio a uma devastadora guerra civil, consolidando-o como “dita- dura do proletariado” e com a edificação de um Estado demiurgo sob a direção do partido único. A propósito, um dos primeiros atos dos bolcheviques no poder foi a dissolução da Constituinte (janeiro de 1918), eleita em novembro, na qual eram minoria. Rosa de Luxemburgo chamou a atenção, de imediato, para as conse- quências daquela conduta: “abafando a vida política em todo o país, a paralisia atinge também, cada vez mais, a vida dos sovie- tes. Sem eleições gerais, sem uma liberdade de imprensa e de reunião ilimitadas, sem o livre confronto de opiniões, a vida se debilita e vegeta em todas as instâncias públicas e a burocracia acaba como único elemento ativo”. (1991, p. 94). Os sovietes e os sindicatos logo foram subordinados ao Estado e ao partido e tornados correias de transmissão, pelos quais eram aplicadas decisões emanadas do centro do poder, via centralismo democrático. A “ditadura do proletariado” reduziu-se cada vez mais à ditadura do Comitê Central – isso foi reforçado com a eliminação e/ou ilegalização dos demais partidos (inclusive aque- les de extração socialista) e a imposição do partido único. Nesse sentido, Lenin, desde o início, salientou o caráter do socialismo a ser construído na Rússia: “Enquanto a revolução tarda ainda a nascer na Alemanha, nossa tarefa consiste em apreender o capi- talismo de Estado com os alemães e implantá-lo com todas as forças, em não suavizar os métodos ditatoriais para acelerar o ocidentalismo na Rússia bárbara, nem evitar os meios bárbaros de luta contra a barbárie”. (1988, p. 303). No decorrer da década de 1920 – envolto em disputas e concep- ções variadas – foi se corporificando um protótipo de socialismo que seria fixado nas décadas seguintes, cujas características gerais podem ser sintetizadas topicamente, como segue: 1. estati- Revolução Russa e O capital 69