Um século russo
Ivan Alves Filho 1
O
século 20 – um século breve, conforme a definição do
historiador marxista britânico Eric Hobsbawm – come-
çou e acabou na Rússia. Teve início em 1917, quando os
revolucionários bolcheviques liderados por Vladimir Illitch Lenin
tomaram de assalto o Palácio de Inverno, num sete de novembro,
em São Petersburgo. E terminou com o fim da experiência sovié-
tica – iniciada em 1921 –, com a queda de Mikhail Gorbachev, o
último secretário-geral do Partido Comunista, em 1991.
Muito já se escreveu a propósito do desmoronamento do socia-
lismo realmente existente. O sistema teria sido minado por seus
próprios desvios burocráticos. Ou sucumbido à poderosa propa-
ganda ideológica do inimigo capitalista. Ou, ainda, desdenhado a
questão da democracia política. Para outros, a corrida armamen-
tista deslanchada pelo campo ocidental, sobretudo pelos norte-a-
mericanos, enfraqueceria de maneira irreversível as economias
socialistas, (historicamente debilitadas, se comparadas com o
desenvolvimento das potências capitalistas, com o ponto de
partida delas). Tudo isso é verdade. Mas existe um outro aspecto
nunca lembrado nessa questão do desmoronamento da União
Soviética: o país não soube – ou não pôde – se dotar de uma base
material que possibilitasse sustentar no topo relações de produ-
ção de novo tipo, livres de qualquer exploração do homem pelo
1 Jornalista, historiador, autor de mais de uma dezena de importantes livros, o último
dos quais é O Homem e o Tapeceiro, editado pela Fundação Astrojildo Pereira
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