100 anos da Revolução Russa PD_ESPECIAL | Page 52

feita pelas multinacionais. No regime militar, esse progresso não foi visto pelos que o combateram. Os “reacionários” foram progressistas e os progressistas foram reacionários. A industrialização por meio de companhias estatais sonhada pelas esquerdas virou um pesa- delo. Ninguém garante que um FNM, um fenemê da Fábrica Nacional de Motores no Brasil, fosse melhor que um caminhão Mercedes ou Scania, ou que poluísse menos: a lei econômica é mais forte que a decisão política. O salário dos trabalhadores da Mercedes ou da Scania de lá não se compara com o dos europeus, mas ganham mais que a média do mercado. Se o valor gerado é baixo, não se pode decretar salário alto. Só a produção de riqueza permite distri- buir riqueza, mas a tendência do capital é concentrar riqueza. Tecnologia avançada pode ter menos poluição. Desde a segunda metade de 1980, já houve lá mais retiradas que investimentos de capital, o que é uma tendência natural da relação entre metrópole e periferia, mas interessa ao capital o aumento gradual dos salários, para gerar um mercado interno forte, que vá aumentar a taxa de lucros. Progressista é entender isso. Para as pessoas viverem melhor é preciso diminuir a taxa de natalidade. Quanto maior a riqueza, mais criminalidade e mais conflitos. O dr. Altenberg, com os óculos na ponta do nariz, consultou seus apontamentos, olhou em volta e, n otando ouvintes atentos, continuou: – No Brasil, o déficit do governo federal vem crescendo desde 1984. Vejam alguns dados: em 1984, o déficit foi de 1,6%; em 1985, foi de 3,5%; em 1986, de 3,7%; em 1987, ele já saltou para 5,4%, enquanto que, em 1988, se prevê um salto para 7,4%. Isso obriga qualquer governo a tomar medidas drásticas, já que uma hiperinfla- ção se torna inevitável. Três são as soluções teoricamente possíveis no curto prazo: 1) não mais pagamento da dívida externa e interna como fonte do déficit; 2) aumento dos impostos para aumentar a receita; 3) redução das despesas, especialmente com o corte de funcionários, assistência social e projetos de desenvolvimento. Dessas três alternativas, nenhuma especula com um aumento súbito de produção. A primeira contraria os interesses dos países indus- trializados e dos credores internos, não sendo de se esperar que aconteça dentro do atual esquema de governo. Poderia haver uma decisão política, de abater o montante da dívida externa para finan- ciar o desenvolvimento, mas não se pode crer que isso vá acontecer por pressões populares ou gestos de generosidade. Nenhum governo consegue manter a legitimidade se serve a interesses externos 50 Flávio R. Kothe